quarta-feira, 20 de setembro de 2017

... E O ÔNIBUS FECHOU A PORTA (Dr. Edison Cattete Reis)



... E O ÔNIBUS FECHOU A PORTA
(crônica tirada do Blog do Dr. Edison Cattete Reis)

- Garota, meu amigo, vi em Viena, num restaurante, uma gata, cara! Quer que lhe diga uma coisa?
- Sim...
Ainda não vi, em Viena ou qualquer outra cidade do mundo, pequena que mais me impressionasse. E olhe que eu sou exigente, heim? Mas aquela me encheu as medidas! E, ao lhe ser apresentado, disse-lhe isto!
- Ah! Você, então, chegou a apresentações, a galanteios mesmo...
- Apresentações? Galanteios? Romualdo, meu chapa, posso lhe garantir que eu tenho esta glória... Bem, mas não precipitemos. Do princípio é que se começa. Estávamos o Cotrim, o Cardoso e eu no tal restaurante. Tínhamos acabado de jantar e estávamos nos preparando para pagar a conta e sair, quando entra a tal pequena acompanhada de uma amiga.
- Ah! Vinha acompanhada a moça?
- Sim. Por uma outra a que não prestei atenção, tão absorvido me achava pela primeira, uma loura, de um louro assim...
Estávamos na fila do ônibus, o tal sujeito que contava a história, o amigo que o ouvia e eu que bisbilhotava a conversa.
Sol quente, rua deserta em bairro longínquo, cabeça vazia de preocupações e aquela voz, por vezes entusiasmada, dando mais ênfase à frase: "uma visão, meu caro!" outras, serena, narrativa, modulada em surdina, a fim de que a atenção despendida para ouvi¬-la possibilitasse uma melhor compreensão do enredo.
- ... de um louro fulvo. A pele alvíssima. Os olhos enormes e incrivelmente azuis. Um sonho, a pequena! Assentou-se ali, numa mesa, junto de nós. Eu fiquei deslumbrado. Chamei a atenção do Cotrim e do Cardoso:
- "Meus amigos, que filé!"
Os dois ficaram boquiabertos. Resolvemos adiar o pagamento da conta e a saída. Conversamos, conversamos, prolongando propositadamente os assuntos.
- ''A loura está te olhando." - disse, de repente, o Cotrim.
- Eu não acreditei. Você sabe lá o que é uma pequena daquelas, que só com a sua presença me fizera ficar atônito, começar, sem que ninguém esperasse, a demonstrar interesse por mim? É uma sensação incrível, você pode avaliar?
- Ah! Certamente!
Tão viva era a descrição, que cheguei a pretender mais uns pormenores sobre a moça: tamanho, talhe, timbre de voz, assuntos que conversava na mesa vizinha, traje, penteado, gestual, charme, lábios, dentes, ouvidos, nariz e garganta.
Cheguei, mesmo, a dar um passo à frente e esboçar um gesto.
Lembrei, porém, da minha triste posição. Silenciei. A narração prosseguiu:
- O Cardoso, como você sabe, é gentilíssimo e, tendo também observado a queda da pequena por mim e eu abilolado justamente por excesso de interesse, não hesitou: levantou-se, acercou-se da mesa das moças, pediu licença, assentou-se e, loquaz como ele só, pôs-se a parolar com elas. Disse maravilhas a meu respeito, que eu era conde, tinha dinheiro, tinha iate e cavalos de corridas. As meninas ficaram entusiasmadíssimas. Você sabe que, na Europa, dizer-se a uma pequena que o cara é conde, tem dinheiro, cavalos e iate é o mesmo que contar para um brotinho de Ipanema que se possui um carro último tipo ou se fez um teste para galã de TV. A maravilhosa criatura, ao ouvir falar em conde, em cavalos de corrida, em iates, ah! Desmanchou-se em sorrisos e redobrou os olhares pro meu lado.
Em dois minutos, o Cardoso se levantou, e, muito afável, convidou-as para nossa mesa.
- E elas aceitaram o convite?
- Aceitaram? Romualdo, elas não queriam outra coisa! Vieram.
O Cardoso fez as apresentações. A danadinha era um filezinho com aqueles olhos azuis fitando-me, plácidos, meigos, profundos. E o sorriso? E o ouro do cabelo a resplandecer? E a conformação do rosto, isto assim de frente a dois passo de mim? E o trejeito gracioso com que me estendeu a mãozinha macia?
Meu caro, fosse eu um poeta, soubesse eu captar e poder transmitir todas aquelas minhas emoções, naquele momento! Inspirar-me-iam poemas imensos, que abalariam o mundo.
- Que pena, não? Perdemos essa obra prima.
- Não graceje, Romualdo. Era uma coisa indescritível. Disse-lhe do prazer que tinha em conhecê-la e de como a sua estonteante beleza me fascinara. Ela me interrompeu o cumprimento-declaração.
 - "Pardonl Comment? Qu'est-ce que vous avez dis?" Romualdo, meu caro, a garota não entendera uma palavra do que eu dissera.
- Mas por quê? Era surda?
- Nada disso. Não entendia inglês e eu não falava uma palavra de fran ...
- Olha o nosso ônibus!
O veículo estacionou. Os dois o tomaram. Eu tinha pressa e o ônibus não me servia. Hesitei um instante. A história me arrebatava, a loura espetacular me fascinava. Estendi a mão para segurar o balaustre. O frescão bufou, cerrou-me a porta na cara e abalou.
E lá se foi a nossa história. A história da pequena alucinante de sorriso transbordante, de porte esbelto, de trejeitos graciosos e olhos azuis translúcidos, que lembravam a limpidez das águas do Arpoador antes que a quilha da primeira nau colonizadora as conspurcasse.
E ali fiquei eu, na rua deserta e tristonha, diante da porta inexorável que se cerrara e do veículo que abalara.

segunda-feira, 18 de setembro de 2017

Dr. Edison Cattete Reis

Dr. Edison Cattete Reis

Primogênito de Astolfo Francisco dos Reis e Maria Cattete Reis, Edison Cattete Reis nasceu no em 18/09/1923. Onze dias antes, em 07/09/1923, a antiga  Freguesia de Sant'Anna do Sapé que pertencia ao município de Ubá, teve o nome reduzido para apenas SAPÉ. E em 1943 o Distrito do Sapé teve seu nome modificado para GUIDOVAL, a cidade natal que Edison tanto exaltava.
Ainda pré-adolescente, aos 13 anos, foi estudar, em regime de internato, no Colégio Anchieta, escola mantida pelos padres jesuítas em Nova Friburgo, no estado do Rio de Janeiro. E lá, fez o antigo ginásio e o curso clássico de 1936 a 1941.
Formado em Letras neo-latinas, foi copidesque no Jornal do Commercio de 1957 a 1974, e escrevia crônicas que eram publicadas nos grandes jornais do Rio de Janeiro como O Globo e Jornal do Brasil, nas décadas de 40 e 50.
As suas primeiras atividades profissionais foram na Pan-Filmes, Livraria Católica, Jornal do Comércio e PUC (1941/43). Trabalhou ainda como redator na Imprensa Nacional (1944/46),
Através de concurso público foi admitido em 1947, como auxiliar administrativo no IBGE, onde fez uma carreira vitoriosa.
Participou na organização da infraestrutura dos Congressos Internacional e Interamericano de Estatística em 1955. Também foi assessor auxiliar e chefe de gabinete da Presidência, além da própria chefia de gabinete da Secretaria geral do Conselho Nacional de Estatística.
Mesmo no período da ditadura militar, o IBGE nunca deixou de publicar nenhuma informação útil ao povo brasileiro. Trabalhou por 44 anos no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), aposentando-se 1991.
É autor de dois livros: “Entre o que foi e o que virá” (2005) e “Viva Guidoval, imortal!” (2009) que reúne as suas crônicas publicadas e conta histórias sobre a nossa Guidoval. Os livros são dedicados à esposa Neuza com quem viveu mais de 50 anos de casado e aos filhos Mônica, Marcos e Edson Jr.
Mesmo saindo tão cedo da nossa cidade, nunca se esqueceu da nossa terrinha, do Rio Chopotó, Marlière, nossas ruas, praças, bandas de músicas e times de futebol.
Dr. Edison Cattete Reis faleceu no 1º de junho de 2011, aos 87 anos.
            Durante a Festa de Santana, deste ano, a sua filha Mônica, primogênita, me presenteou com os dois livros e me pediu para publicar os seus textos no BloGuidoval e no Grupo “Quintal de Guidoval”. Uma forma de eternizar as palavras, pensamentos e ações do Dr. Edison.
Eu já havia divulgado um pouco do talento de escritor do Dr. Edison quando escrevi o artigo, uma resenha, intitulado “Um guidovalense notável” que foi publicado em dezembro/2005 no JORNAL DE GUIDOVAL, dirigido pelo meu irmão, o Professor Marcílio Vieira. O link para ler o artigo é http://www.devieira.com.br/jornaldeguidoval.com/dr_edison_12.htm

A partir de hoje, começo a cumprir o prometido à Mônica.