José Occhi (Bijica)
A Rua do Fundão (Sete de Setembro) é uma
das principais artérias da nossa cidade. Tinha vários casarões. Um deles
abrigou a Prefeitura Municipal e uma cadeia improvisada. Antes serviu para
abrigar as Escolas Reunidas. E bem antes,
este casarão, foi propriedade do Afonso Celso de Assis Figueiredo Júnior, o Conde Afonso Celso (professor, poeta, historiador
e político brasileiro), um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras.
Além deste casarão, o Conde Afonso Celso era proprietário da Fazenda Santana.
Pois bem, mas
voltando ao casarão do Fundão. Em frente dele, nos idos de 1960, tinha a Barbearia do Sô Nilo, que além de fazer
barba e cabelo, fazia a cabeça de muita gente, principalmente quando o assunto
era música. Executava, com maestria vários instrumentos, com destaque para o violão,
violino, cavaquinho, bandolim e banjo.
Assim que
escurecia, início da noite, Sô Nilo guardava tesoura, navalha, giletes, aqua velva,
talco, álcool, avental, pincel, pentes, cubas e potes, perfumes e lavandas. E
tirava dos armários maracá, afoxé, pandeiro, reco-reco, caixa de som,
amplificador, microfone e colocava-os à porta da sua barbearia. E iam chegando
os cantores, ritmistas, público em geral, para assistirem ou participar de mais
um show musical.
Eu, nesta
época, criança, por vezes, escapulia da vigilância da minha mãe e ia espiar, à
distância, este espetáculo gratuito, ao ar livre, na Rua do Fundão.
E me lembro de
alguns dos artistas deste improvisado show. Sô Lau (Carlos Victor Pereira), cantava
sambas, tocava pandeiro; Landinho Estulano cantava modinhas, tirava sons do
afoxé; Josias do Pombal, além de cantor, era compositor, autor do “Footing no Fundão”, um samba sincopado;
Bebeto Ramos e Zé do Gil também cantavam. O Jeová, voz de tenor, imitava o
grande Vicente Celestino; o Zé Fio (Barão),
voz tonitruante, cantava músicas de Jorge Veiga e Moreira da Silva. O Vicente
do Dario, neto do Chico do Padre, imitava o Miltinho.
Frequentava
também a barbearia, como aluno de do Sô Nilo, o Domingos Coelho da Silva, autor
de uma das mais belas canções exaltando a nossa terra com o majestoso nome de “Guidovalense de Guidoval”. Outro que
por vezes aparecia era o Zé Manga Rosa, um grande violonista.
O Sô Odilon
Reis, alfaiate, coletor, exímio violinista, sempre aparecia dando uma canja aos
ouvintes. Se déssemos sorte poderia ouvir o violão de João (Queiroz do Pinho) a quem o Sô Nilo dedicou um belo chorinho. Esta
sorte eu não tive.
E diante
tantos músicos e cantores, um sempre referenciado e lembrado era o José Occhi,
conhecido pelo apelido BIJICA, filho
do Sô Orestes, um italiano que escolheu Guidoval para criar a sua Família eque
tanto enriquece a história do nosso município.
Também não
tive a sorte de ver o Bijica se apresentando na Barbearia do Sô Nilo. Só vim a conhecê-lo muitos anos depois, por
volta de 1974, quando ele apareceu no Bar do Oscar Occhi, seu irmão. Estávamos
em plena cantoria, Sô Nilo, Sô Odilon, Carminha do Virgílio, Professor Salim.
Assim que o
Bijica entrou no bar fez-se um silêncio total. Era como se estivesse adentrado
o recinto uma celebridade. E o Bijica era, para nós guidovalenses, uma
celebridade. Todos o considerava a mais bela voz masculina de Guidoval. Depois
do silêncio, foi uma troca geral de abraços entre amigos.
De todos os
abraços, o que mais ficou retido na minha memória foi o do Maurício Queiroz,
filho do Sô Nhonhô e Dona Zélia, amigos desde a infância e que há muito tempo
não se viam.
ERA FESTA DE
SANTANA, TEMPO DE CONFRATERNIZAR, ABRAÇAR OS AMIGOS, AGRADECER AS BENESSES DA
PROVIDÊNCIA DIVINA, SOB A INTERCESSÃO DA PADROEIRA SANTANA.
Depois o
Bijica deu cantou músicas que foram e eram sucesso na voz de Gilberto Alves,
Nelson Gonçalves e Orlando Silva. E a voz do Bijica não ficava devendo nada a
estes astros dos tempos do rádio.
A segunda vez
que encontrei-me com o Bijica foi numa OUTRA Festa de Santana. No local onde é
a residência do Márcio Barbosa era um lote vago que pertencia ao querido Dr.
Mário Geraldo de Meireles. E neste local instalaram um barzinho improvisado
onde tive a honra de acompanhar, ao violão, o Bijica.
E a terceira
vez que foi em 1978, em plena terça-feira de carnaval, o Professor Ibsen
Francisco de Sales (Salim) intimou-me
a abandonar o baile momesco no “Clube
Francisco Campos” para acompanhar o Bijica (José Occhi) numa serenata.
A princípio,
tentei adiar o evento para um outro dia. Não consegui. Salim usou de argumento “ad
populam” (*). “Foi golpe baixo mesmo, do tipo”não conte mais com minha
amizade”, “nunca mais fale comigo”.
Cedi-me à sua
lógica, renunciei-me à folia e fomos à serenata. O Bijica com a sua voz
melodiosa, a mais bela da história de Guidoval, parecia o flautista de Hamelin.
Quase metade dos foliões desistiu do folguedo para acompanhar e ouvir o Bijica.
No mínimo, sem
exagero, uns 50 carnavalescos deixaram o salão para acompanhar a serenata,
ouvir o Bijica.
Durante o
percurso da serenata o cordão foi só aumentando. Sem dúvida, uma serenata
memorável, patrocinada pelo romantismo e insistência do Salim, carregando um
litro de conhaque e outro de campari para matar a nossa sede.
Agora, a
Prefeita Soraia inaugura o Bairro José Occhi (Bijica) com um conjunto
habitacional de 120 casas. É uma homenagem ao Bijica, mas eu considero uma
grande homenagem à toda Família Occhi.
A gratidão é
um dos mais nobres sentimentos. Uma virtude.